MEU MUNDO SE CHAMA ESPERANÇA

Eu vivo num mundo com dimensões extraordinárias, mesmo que eu pudesse eu jamais caminharia por todos os cantos e veria cada cultura.

Minha vida tem sentido sim... Vejo a vida, assim como vejo a morte, tenho uma visão ampla do futuro. Ando por aí por caminhos que você nem imagina, vejo coisas que minha mente guarda a sete chaves, sinto o que muitos não sentem...

Você pensa que meu mundo não tem sentimento e que me acostumei a viver mecanicamente..."Errado" Me acostumei a viver a vida...Sim a vida dos outros.

Você me pergunta se isso é justo...Talvez não seja ou você entenda que não é justo, mas para mim é gratificante.

Tive tempo e muito tempo para escolher o que seria melhor pra mim, mas preferi escolher o que seria melhor para os outros...Parece triste?

Pois não é, bem pelo contrário vivo cada segundo como se fosse o ultimo, exatamente por tudo aquilo que vejo e ja vi.

Não tenho escolha, você acha que eu tenho outros caminhos, mas não eu já percebi que por mais que corra pra longe de tudo eu não seria eu.

Parece designação....destino, seja lá o que for, onde quer que eu esteja eu escolhi num mundo tão extenso viver pequeno, no meu mundo, um mundo que para os teus olhos pode ser solitário, mas para mim é repleto de alegrias e descobertas. Não sou arvore e não dou frutos, mas semeio o bem, tento nesse mundo tão grande e cheio de oportunidades para você, mas tão pequeno pra mim, fazer o melhor, dar o melhor de mim, não espero de ninguém um obrigado, o reconhecimento eu já tenho .."o meu"...

E a cada dia vejo nos olhos das pessoas a esperança da cura, a felicidade da recuperação, vejo o brilho da vida na qual estava ali ao lado dando forças para que isso acontecesse...Então me desculpe, mas o meu mundo é maior e muito melhor do qualquer outro mundo.O meu mundo se chama esperança!

Sou Enfermeiro/Técnico de Enfermagem/Auxiliar de Enfermagem e a minha vida é assim:

São exatamente 01:00 horas, lá fora desaba a chuva, ouço relâmpagos e o cair forte da água da chuva , enquanto debruçado em meio aos relatórios de Enfermagem.Numa sala de emergência lotada com pacientes de todas as gravidades, já quase sem leito disponível.

Uma unidade do SAMU encosta-se a frente à sala de emergência e logo outra se aproxima, um acidente grave nas proximidades acometera 2 vitimas. Uma situação complicada numa unidade já quase sem condições de receber pacientes devido ao grande fluxo de hoje “um dia inusitado” . Mas ali me encontro só, pois os outros setores da unidade também estão lotados e trabalhamos com um número reduzido de profissionais, sem contar aqueles que estão afastados por motivo de doença. 

Neste momento tenho que me desdobrar são muitos os cuidados e minha jornada esta apenas começando. Uma senhora que acompanhada por sua filha me pergunta “será que vai demorar muito pra me atender, estou com muita dor”, todos aqui estão com muita dor senhora, mas já será atendida, eu apenas estou preparando sua medicação. Um caos... 6:00 horas todos os relatórios feitos, unidade em ordem, e um dos meus colegas chega para me render na troca do plantão.”Feliz por mais uma jornada cumprida” e todos os pacientes apresentando melhora e os mais graves transferidos para uma outra unidade com mais recursos.

Agora 07:00 horas a caminho de uma outra cidade aqui perto para mais um jornada de 24 horas.

Já 16:00 horas e mais de 10 atendimentos em uma unidade de urgência “ aqui trabalho numa ambulância” só acidentes foram 7 dentre eles 5 de moto. Meu uniforme todo molhado, ainda chove muito, em direção a base na tentativa de tentar almoçar, ao menos o almoço pois café ainda não tomamos. No radio um chamado de urgência nos faz mudar nosso destino, nosso destino agora, meu e do meu querido condutor é o QRU...”mais um acidente grave com mais de uma vitima” atendimento qual nos deixará empenhados por mais algum tempo, neste momento já até esquecemos que estávamos com fome.

São 20:00 horas conseguimos chegar na base, felizes pois tudo correria sem intercorrências...”O jantar já está tão frio”, mas não tem outro jeito vamos comer assim mesmo.

A noite se passa, o dia hoje está muito melhor, a chuva já passou e o sol brilha lá fora, vejo casas, terrenos, enfim 9:00 horas e de volta ao serviço de emergência para mais 12 horas e novamente com a sala de emergência lotada. Hoje é aniversário do meu filho, todos estão comemorando.

Meus pacientes necessitam de cuidados, não dá tempo de pensar no que acontece lá fora, aqui ta um caos novamente. Ouço vozes, uma gritaria só, quando coloco os olhos pelo corredor lá chega mais uma emergência. Um rapaz olha me apontando como se eu fosse o culpado e diz “meu pai está morrendo e você não vai fazer nada”. Na tentativa de acalmar o rapaz tentei fazer o atendimento o mais rápido possível , junto com o médico, mas infelizmente dessa vez não correu tudo bem. Continua lá fora uma gritaria total, e ouço”se eles não tivessem demorado tanto pra atender meu pai não teria morrido”. Foi uma fatalidade um infarto fulminante, mas não tem como acalmar a família numa hora dessas. 

No meio a tanta confusão o tempo passa como o vento e na morte nos sentimos fracos e parece que levamos todo aquele sentimento ruim conosco. Enfim um colega chega para a passagem do plantão. “Que domingo pesado esse, desde sexta fora de casa”. Chegando na minha casa, todos já estão dormindo, a festa do meu filho já acabou...”Nossa nem comprei um presente, é mas agora já está tarde, mas amanhã quando estiver indo pro trabalho eu compro algo que o agrade e na quarta feira eu o presenteio”

Essa e assim é a vida de um Enfermeiro/Técnico de Enfermagem/Auxiliar de Enfermagem, com um dos menores salários do País e com uma jornada tão extensa.

Sei que a culpa não é sua, mas cuidamos de vida, da sua vida, enquanto por muitas vezes deixamos de lado a nossa vida, nossa família, muitos de nós levamos uma vida solitária pra cuidar de gente e somos tão pouco valorizados... Mas mesmo contudo, amamos a Enfermagem, só precisamos ser reconhecidos como alguém que irá cuidar de você e de sua família quando precisarem, mais uma vez repito a culpa não é sua...A culpa é nossa acostumamos a viver assim sem cobrar de quem realmente tem culpa....

Texto original de Jefferson Viana